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"Onde Falham as Cidades", de Vítor Andrade


Onde Falham as Cidades

Vítor Andrade [*]

Edição: 2005

Editora: Expresso, Temas e Debates

Páginas: 192


Estava eu a frequentar o antigo MUOT (Mestrado de Urbanismo e Ordenamento do Território) no ISTécnico quando deparei-me com este livro meio esquecido, num alfarrabista de Lisboa.

O seu título é bem apelativo, porque tanto dá para a afirmação como para a interrogação. Um livro que nos diz “onde falham a cidades”, mas, também, que nos leva a refletir “onde falham as cidades”?

O livro é uma compilação das entrevistas publicadas no jornal Expresso (com as devidas adaptações) a várias personalidades que de certa forma estão ligadas ou têm intervenção direta na administração e gestão do território, sejam políticos ou técnicos das áreas da arquitetura, urbanismo, engenharia e geografia.

Neste artigo, de apresentação do livro do mês de setembro, apenas colocarei alguns excertos das entrevistas, tentando não tecer qualquer opinião, dando liberdade ao leitor de fazer as suas próprias interpretações.

Sendo assim, “onde falham as cidades?”


“É preciso humanizar as cidades” Jorge Sampaio, Presidente da República

Para Jorge Sampaio, antigo Presidente da República: “as cidades, em geral, têm, em toda a Europa, crescido por imposição do automóvel e pela urbanização das pessoas. Temos de ter uma política de espaço público humanizado completamente diferente.”



“A qualidade da cidade ainda não dá votos” Gonçalo Byrne, Arquiteto

Falando da qualidade de vida e qualidade da paisagem urbana, segundo Gonçalo Byrne Quem decide são as pessoas que têm sobretudo a capacidade política e, no nosso caso, talvez ainda mais aquelas que têm capacidade económica.


“As cidades estão um caos” Gonçalo Ribeiro-Telles, Arquiteto-paisagista

Questionado sobre o processo de urbanização das nossas cidades, o Arq. Ribeiro-Telles afirma: “continuamos a praticar uma expansão urbana em mancha de óleo, criando subúrbios sem respeito nenhum pela natureza destes territórios, nem pelas vocações dos espaços que compreendem.”



“Preocupa-me o futuro do território” Helena Roseta, Arquiteta

A Arq. Helena Roseta foca, também, a sua atenção no espaço público de qualidade: “Temos de restaurar uma cultura de amor pela cidade, pela qualidade urbana, e aí a prioridade é o espaço público.”



“Nunca tivemos uma política séria de cidades” Jorge Gaspar, Geógrafo

O professor Jorge Gaspar, que algumas vezes o ouvi e li, centra a entrevista na política e no planeamento estratégico que estas têm de ter: “infelizmente constrói-se muito sem ter em conta o planeamento. (...) É necessário ter um entendimento mais urbanístico da expansão da cidade. Urbanístico no sentido da arte de produzir a cidade.”



“O espaço público está hipotecado ao automóvel” Manuel Graça Dias, Arquiteto

A mobilidade das cidades é a grande falha que este arquiteto sustenta.

Hoje, quinze anos depois do lançamento do livro, muito se fala de mobilidade e a luta continua a mesma. Parece que nada mudou.

A cidade de Lisboa, por exemplo, avançou este ano com projeto de retirar os carros da Baixa Pombalina e houve vários entraves e dúvidas por parte de moradores e comerciantes. Mais recentemente, com a implementação de vários km de ciclovia em algumas avenidas e até com a promoção do projeto “A Rua é sua”, há opiniões contra estas medidas que apelidam de “medidas avulso e descabidas”. Esta forma de pensar tem origem na nossa educação do “sempre foi assim e sempre será assim”, parece que não sabemos viver sem o nosso querido e amado carrinho.



“Há muito a fazer no chão da cidade” Pedro Brandão, Arquiteto

Pedro Brandão realça o assunto atrás apresentado: “temos, de um lado, os espaços públicos das cidades antigas, destruídos pelo automóvel, pela publicidade abusiva, pela incivilidade e falsas modernidades, e de outro lado novos espaços urbanos, nascidos dos negócios, descosidos e disléxicos, plantados nos lugares do nada, onde ninguém se pode sentir em casa, mas onde vive a maioria da nossa população.”



“Temos de viver a cidade” Jaime Lerner, Arquiteto

Segundo o arquiteto brasileiro Jaime Lerner para uma melhor qualidade de vida nas cidades é necessário vontade política, uma visão solidária. Ou seja, “aprender a ver a cidade através dos olhos de cada cidadão.”

Em 2019 tive a oportunidade de conhecer Curitiba (não sei se ele chama a cidade de sua, mas muito de Curitiba tem a sua mão) e fiquei fascinado. Fiquei uma semana na cidade e me senti da própria cidade logo no segundo dia. Exatamente como ele afirma: A cidade tem de ter densidade suficiente para saber que tem gente junto e solidariedade para você saber que não está só na multidão.”



Espero que tenha conseguido mostrar-te o quanto este livro é interessante de ler. Um tema muito discutido ao longo dos anos e sempre atual.

Transcrevo na íntegra o índice, para te aguçar o apetite de leitura:


"Uma praça moderna", José António Saraiva

"É preciso humanizar as cidades", Jorge Sampaio

"A qualidade da cidade ainda não dá votos", Gonçalo Byrne

"As cidades estão um caos", Gonçalo Ribeiro Telles

"Temos de cultivar uma cidade aberta", Guilherme D'Oliveira Martins

"O Euro 2004 foi a apoteose do lóbi do betão", Vítor Cóias e Silva

"Falta-nos a cultura da exigência", Leonel Fadigas

"Preocupa-me o futuro do território", Helena Roseta

"Nunca tivemos uma política séria de cidades", Jorge Gaspar

"Precisamos de um urbanismo ditador", Francisco Sousa Soares

"O espaço público está hipotecado ao automóvel", Manuel Graça Dias

"Há muito a fazer no chão da cidade", Pedro Brandão

"Perdeu-se o culto da sociabilidade", Rogério Gomes

"Temos um urbanismo medíocre", Sofia Galvão

"As cidades precisam de uma estratégia", Ernâni Lopes

"Não há cidades ideais", António Mega Ferreira

"Temos de viver a cidade", Jaime Lerner



Uma curiosidade: na capa está uma imagem da cidade de Quarteira.

A minha cidade ou talvez uma das minhas cidades.

O meu gosto pela Geografia começou na Escola Secundária, em Quarteira.

A minha visão urbanística mais antiga e marcante da antiga vila de Quarteira foram as obras das avenidas de Sá Carneiro e Mota Pinto que romperam a cidade ao meio, criando uma 1.ª linha e uma 2.ª linha de edifícios paralelos à costa. O crescimento da cidade foi segundo o traçar desta grande avenida.

"Quarteira: crescimento controlado" in Loulé Magazine, abril de 1989.

Recordo-me de uma rotunda improvisada com uma casa tradicional algarvia ao meio (que bem lutou, mas tinha o destino traçado, a demolição). Ainda hoje guardo uma foto disso que encontrei numa pesquisa no Arquivo Municipal de Loulé, durante a elaboração do meu relatório de seminário em Geografia Urbana.


Também podia falar do antigo bairro de lata dos Pescadores, do enquadramento paisagístico da Torre 20 ou do túnel que ligava a CHECUL à Escola C+S, entre outras coisas mais.

Numa das praias de Quarteira ficava a olhar para os prédios, quando todos os outros olhavam para o mar. Ao mesmo tempo, ficava fascinado com o desaparecer da praia no Inverno. Só os quebra-mares salvavam a cidade.

E foi aí que apareceu o desejo: “tenho de entender tudo isto.

Quero estudar Geografia!



[*] Vítor Andrade é jornalista no Expresso desde 1989. Licenciado em Comunicação Social pelo ISCSP, começou a carreira em 1985 com colaborações em vários jornais regionais e também no suplemento do DN Jovem, do Diário de Notícias, onde foi premiado. Em 1998 e 1999 ganhou os prémios de jornalismo imobiliário, promovidos pela Associação Lisbonense de Proprietários e pela Câmara Municipal de Lisboa.



Boas leituras geográficas 📚



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Rogério Madeira

Geógrafo

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